segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Senti vergonha da minha cidade

CRÔNICA DE SÁBADO de Rosane de Oliveira

Perdi a conta das declarações de amor que fiz a Porto Alegre, essa cidade que escolhi para viver aos 17 anos. Sou porto-alegrense por opção e assinaria embaixo da campanha da prefeitura “Eu curto, eu cuido”, inspirada no slogan do Rio de Janeiro “Eu amo, eu cuido”. Por isso, sinto-me muito à vontade para criticar o que vai mal.
Na quinta-feira, andando pelo Centro para encontrar no Mercado Público uma francesa que mora em São Paulo, senti vergonha da minha cidade. Saí da Praça da Alfândega com aquele calorão de 38ºC e deparei com a Rua da Praia mais vazia do que de costume. Sem a multidão, pude ver o estado de calamidade em que está o calçadão. Pedras quebradas ou retiradas, substituídas por cimento mal-acabado, com irregularidades que podem provocar um acidente. Havia sujeira por todos os lados, mau cheiro, sinais de degradação. O que está havendo com a antes charmosa Rua da Praia, cantada em prosa e verso?
Na Borges de Medeiros, encontrei grupos de sindicalistas que se preparavam para a passeata do Fórum Social Temático e uma diversidade de bandeiras. Aqui e ali, ouvia-se uma frase em língua estrangeira. Eram os participantes do Fórum circulando sob o sol de janeiro, alguns usando chapéu para proteger a pele, e eu preocupada com a imagem que levarão da nossa cidade.
Chegando ao Largo Glênio Peres, vejo um tapume que já deve ter feito aniversário. Atrás dele, uma espécie de canteiro. O que mesmo é aquilo? O chafariz que não deu certo? Se alguém me perguntasse o que é aquela ferida exposta no centro do Largo, eu não saberia responder. Visto dali, o prédio do Mercado forma um harmonioso conjunto arquitetônico com o Paço Municipal. Os sinais do incêndio que destruiu parte das bancas e restaurantes, em julho do ano passado, só podem ser vistos de outro ângulo ou do lado de dentro.
Tinha combinado com a francesa que iria esperá-la na Banca 40, o melhor sorvete com salada de frutas de Porto Alegre. Cheguei antes dela. O Mercado era um forno. Consegui uma mesa próxima do ventilador para suportar aquela sauna seca. Quando a francesa e seu colega de trabalho chegaram, expliquei que o mercado ainda estava em reforma depois do incêndio. Cada uma bebeu uma garrafa de água, porque sem ar condicionado nem sorvete dava ânimo para tomar. Ela me perguntou sobre o que eu achava da cidade e tive de admitir: Porto Alegre está mal. Não sei se é só a crise financeira ou se são os gestores que não conseguem aplicar o slogan “eu curto, eu cuido”. Não falo dos transtornos provocados pelas obras, que esses são compreensíveis. Falo de cuidado mesmo com o espaço público.
O Centro não é o único problema. Em vários bairros, o matagal toma conta dos canteiros. O programa que prometia obrigar os proprietários a consertarem as calçadas ficou pela metade. No Moinhos de Vento, por exemplo, cadeirantes não têm como transitar pelas calçadas. Cegos correm o risco de tropeçar e cair. Em frente ao Hospital Fêmina, por exemplo, a calçada é um lixo. Será que o Grupo Hospitalar Conceição, que acabou de fazer uma reforma no Fêmina, não tem dinheiro para consertar a calçada? E a prefeitura não cobra?
Calçada do Hospital Fêmina
Calçada do Hospital Fêmina
Aliás, a prefeitura não tem muita moral para cobrar, porque o asfalto em frente ao mesmo Fêmina _ completamente reformado há pouco tempo _ afundou na faixa da direita, pelo peso dos ônibus, indício de que a obra foi malfeita.
Já falei aqui do lixo espalhado pelas ruas e da má utilização dos contêineres por pessoas que ali depositam resíduos recicláveis. Os catadores vêm, retiram o que lhes interessam e deixam os restos na calçada. Está em vigor, mas não começou a ser aplicada ainda, a lei que prevê multa para quem joga lixo no chão. Isso pode resolver parte do problema, mas o poder público precisa fazer a sua parte.


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